3.29.2003

Acabou de chegar aqui...


Fechar o tempo nem sempre é sinônimo de briga. Muito pelo contrário, raios e trovões no céu podem estar anunciando um período de muita paz e amor. Quando a programação de verão sai de cartaz, e os longos dias chuvosos tomam seu lugar, o primeiro respingo que cai sobre muita gente é o da solidão. Contemplar da janela aquela paisagem nebulosa e no quarto encarar aquele cobertor, sem ter nenhum pé quentinho para dividi-lo, faz com que um namorado seja tão necessário quanto as galochas e o guarda-chuva.

A solteirice dos bons tempos deu lugar àquele vazio que não ter ninguém para comentar o filme da “Sessão da Tarde” causa. Porque mais do que água, a chuva traz carência, reflexões e vontade de ter alguém para dividir o fondue e a garrafa de vinho. “Ah, dia de chuva dá vontade de ficar tomando chá e dando beijo de língua quentinho. O problema realmente é quando não se tem ninguém pra isso”, reclama a programadora visual Gabriela Marques. E exatamente por essas vontades que desabam sobre muitas criaturas, junto com o temporal, é que certas decisões, antes dadas como definitivas, são revistas. “Terminei com um casinho que vinha tendo e, logo no primeiro fim de semana sozinha, chega uma frente fria cavernosa. Sem ter nada pra fazer, me deu uma vontade louca de ligar pra ele pra ir ao cinema, tomar um vinho ou fazer qualquer coisa a dois... Me controlei ao máximo, mas quando chegou o domingo, foi ele que acabou me ligando. Pela mesma razão, diga-se de passagem”, conta a assessora de imprensa Laís Fernandes.

A melancolia que os dias cinzas trazem é capaz de nos fazer ter os desejos mais inusitados. Talvez pelo clima mais do que intimista que o molho em casa proporciona. “Nos dias de chuva, o melhor programa é ficar namorando, tomando chocolate quente, vestida só de casaco e meia. Se o Rodrigo, meu namorado, não mudar de idéia, acredito que vou passar esse inverno assim. Ainda bem, porque o último foi uma deprê horrorosa, disputava com as nuvens quem chorava mais”, diz a fisioterapeuta Mariana Magalhães. Essa teoria de que o tempo fechado abre nossos olhos para a carência, segundo o psicólogo Cássio dos Reis, tem fundamento. “O sol impulsiona as pessoas, traz ânimo, excitação, levanta a auto-estima. Muita gente nem se dá conta de suas necessidades e angústias porque está com o dia repleto de atividades e interagindo com outras pessoas. Quando o tempo muda e se é obrigado a ficar mais quieto, sozinho, facilita que a pessoa se volte para ela mesma e faça reflexões sobre a vida, relacionamentos e valores numa tentativa de suprir sua carência”, explica o psicólogo.

Por isso que tantas pessoas fazem do fiel caderninho de telefones um aliado tão essencial quanto a velha e boa capa de chuva nos dias cinzentos. “Em dia de chuva ficar em casa feito um sofá não dá. Se não estou namorando ou saindo com ninguém, eu ligo pros amigos pra tentar marcar de assistir a um filme ou de fazer alguma extravagância gastronômica. Faço de tudo pro baixo-astral não me pegar, porque, se ele pega, já era... Viro filósofo de botequim”, assume o publicitário Marcelo Barreto da Costa.

No entanto, essa nebulosidade interior nem sempre é reflexo da meteorologia. Quem já está passando por um momento difícil, muitas vezes acredita que até São Pedro anda fazendo complô pra jogar água fria. “Se não estou numa boa fase, o tempo chuvoso, com certeza, contribui para que ela fique ainda pior. Porque pelo menos quando tem sol, eu saio, vejo gente e sempre acaba rolando um programinha para clarear as idéias. Ficar em casa sozinha, na fossa, com a chuva caindo lá fora, é de deixar qualquer um se sentindo a mais mal-amada das criaturas”, revela a bióloga Fabiana Galvão.

O tempo, sem dúvidas, influencia os comportamentos e os relacionamentos humanos, independentemente se você tem ou não motivos para ficar melancólico com a chuva que pinga sobre seu telhado. ”O tempo age diretamente sobre a gente. Para comprovar isso basta analisarmos o povo brasileiro, que é expansivo, sensual e comunicativo, porque vive num clima onde o calor propicia a interação entre as pessoas. Já os ingleses, que vivem muitos dias frios, são bem mais introspectivos, reservados e emocionalmente contidos”, descreve Cássio dos Reis. No entanto, se a previsão meteorológica não é das melhores pra você, já que chover lá fora significa seca na sua horta, não se desespere – porque dizem por aí que depois da tempestade sempre vem a bonança.

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Fala sério.

Ninguém merece.

Agora sim, eu quero colo.

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