7.17.2003

.f.a.i.r.y.t.a.l.e.

"Era uma vez uma menina. Ela não era uma menina comum. Mas também não era uma menina especial. Não nasceu em uma manjedoura. E nem em um berço de ouro. Ela tinha uma missão. Embora não soubesse exatamente qual era, começou sua busca assim que aprendeu as primeiras palavras. Desde cedo aprendeu a valorizar tudo e todos. A respeitar. A ser gentil. A dividir, compartilhar. Cresceu correndo com os lobos, voando com os falcões, nadando com os golfinhos. Os vaga-lumes eram suas lanternas, o vento a sua música e a Lua a sua guia. Aquecia-se no sol da manhã, mesmo que por alguns minutos, o que garantia uma boa dose de energia para continuar sua busca. Um belo dia, descobriu que tinha sido abençoada com um dom extra. Sim, ela descobriu que tinha o poder de semear sorrisos, mesmo nos terrenos mais áridos. Ela tinha o toque capaz de aquecer até mesmo o coração mais gélido. Ela descobriu que ficando em paz consigo mesma, poderia irradiar energia colorida, em forma de abraços, risadas e palavras. E seguiu em sua missão, utilizando sabiamente seu dom, fazendo com que as pessoas a sua volta fossem felizes. Algumas pessoas não conseguiam admitir isso, e esse brilho todo acabou cegando algumas pessoas, que invejaram o seu jeito tão alegre de viver. E ela foi enfeitiçada. Uma maldição horrível caiu sobre a menina, já então quase-mulher. Tinha dias que ela mal conseguia respirar. Ela não conseguia mais fazer nada pelas pessoas a sua volta, como se estivesse algemada, presa, encarcerada. Os animais, até então seus companheiros, sumiram. Ela foi perdendo todo aquele brilho, como se tivesse entrado em uma caverna escura. E doía. Muito. Ela sentia muita dor, que se transformavam em lágrimas. Ela lutava contra aquela maldição, mas era como se estivesse presa em uma rede. Quanto mais lutava, mais ficava presa. E ela sofreu em silêncio, engolindo tudo de mal que lhe era feito. Mas ela não conseguia digerir o mal, e ele foi se acumulando, atravessando em sua garganta. E ela foi ficando doente, muito doente. Foi perdendo as forças, esqueceu de continuar sua busca, perdeu a vontade de tudo. Como uma flor sem água, ela foi murchando, sufocada com tanta amargura. Com o último suspiro de força que lhe restava, ela deu um impulso e rastejou para sair da caverna sombria. Foi rastejando para a luz do sol, aquele que a enchia de energia. Pouco a pouco, começou a se reerguer. E descobriu, já mulher, que os anos haviam passado rápido demais. Mas que tudo aquilo que foi sufocado no interior da caverna ainda vivia dentro de si. E, pouco a pouco, seus dons retornaram, e ela voltou a cuidar das pessoas, a cuidar dos animais, a cuidar da vida, como o bem mais precioso que existe. E a vontade de fazer as pessoas felizes tomou proporções absurdas, que ela mesmo não sabia controlar. Em seu pescoço, uma marca de tudo o que foi guardado. Até o dia em que, caminhando pela floresta, ela encontrou um shaman. Um curandeiro que propôs uma troca. Ele poderia tirar as mágoas atravancadas em seu pescoço em troca de uma promessa. E ela aceitou. No dia marcado, ela encontrou-se com o shaman na beira de uma linda cachoeira. A prova de fogo seria ter coragem o suficiente para permitir-se ser cortada por uma espada mágica. Ela estufou o peito, buscou forças dentro de si e enfrentou o desafio. Concentrou-se, enviou para o pescoço tudo o que a incomodava, tudo o que lhe fazia mal. A lâmina da espada brilhou e rapidamente rasgou seu pescoço e as dores e mágoas saltaram para fora, na forma de pequenas bolotas verdes que saíram pulando. E elas foram batizadas de 'sapos'. Ela caiu em um sono profundo. O ferimento causado fechou logo em seguida, deixando uma pequena marca. Ao acordar, ela seguiu em sua busca, e continou semeando sorrisos, curando corações tristes e lutando pela vida, em todas as suas formas. Jurou para si que nunca mais, ninguém anularia seu brilho. E assim a maldição se desfez. Prometeu ao shaman que tudo o que aprendera até então seria compartilhado. Não guardaria para si as coisas boas que a grande árvore da vida havia lhe ensinado. E não permitiria que as pessoas engolissem mágoas e dores. Aos poucos, os lobos voltaram a correr a seu lado. Os falcões lhe faziam companhia, juntamente com as corujas, símbolos máximos da sabedoria. Os golfinhos se juntaram a ela novamente, com a graça e o jeito leve de viver. Diz a lenda, que até hoje ela pode ser vista por aí, buscando algo que não sabe o que é e lutando por aquilo em que realmente acredita: a magia do viver..."







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